Aos 85 anos, Adelaide Marcolino Peixoto de Oliveira, conhecida como Dona Adelaide, está prestes a escrever um capítulo inédito na história do futebol brasileiro. Viúva, mãe de 12 filhos, indígena da etnia macuxi e presidente do tradicional River Esporte Clube desde 2004, ela se prepara para assumir o comando da Federação Roraimense de Futebol (FRF), tornando-se a primeira mulher — e a primeira indígena — a liderar uma federação estadual de futebol no país.
A possibilidade se abriu com a eleição de Samir Xaud para a presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), neste mês. Samir é o atual presidente da FRF, mas deve deixar o cargo em definitivo até 2027, e já indicou publicamente Dona Adelaide — atual primeira-vice-presidente da entidade — como sua sucessora natural.
Embora o estatuto da federação permita a nomeação direta de um substituto em caso de vacância, a escolha por Adelaide tem forte valor simbólico e político. Ela representa não apenas a continuidade da gestão Xaud, mas também uma quebra de paradigmas num esporte historicamente masculino e elitizado.
Dona Adelaide é um nome venerado no futebol de Roraima. Nascida em 1939, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, ela viveu de perto a formação do River, clube fundado por sua família em 1973. Entre os feitos do Verdão da Aparecida, como é conhecido, estão três títulos estaduais (1980, 1985 e 1989) e um vice-campeonato do Copão da Amazônia (1981). Mesmo com limitações de saúde nos últimos anos, ela continua atuante — inclusive disputou uma partida como goleira amadora nos anos 1980 e esteve presente na abertura do Campeonato Roraimense de 2025.
Força das mulheres
Sua possível ascensão acontece num momento em que a presença feminina na estrutura do futebol brasileiro começa, ainda que timidamente, a ganhar espaço. Atualmente, apenas uma mulher preside uma federação estadual: Michelle Ramalho, da Paraíba. Em 2025, ela também fez história ao ser eleita vice-presidente da CBF — a primeira mulher a ocupar esse posto em mais de 100 anos de entidade.
O caminho de Dona Adelaide, no entanto, é ainda mais singular. A idade avançada, a origem indígena e a trajetória como dirigente de um clube pequeno do Norte do país tornam sua eventual posse um marco de representatividade inédito no futebol brasileiro.
Como ela mesma costuma dizer, com humor e serenidade: “Se tiver um voto pro Zeca (Xaud), será da Adelaide, do River. Ele é ótimo. E enquanto ele apoia a gente, estou aqui para apoiar também”.
Agora, o apoio é retribuído. E a história da bola ganha mais uma personagem improvável, forte e inspiradora.